O recente anúncio da compra da Electronic Arts por um consórcio formado pelo Public Investment Fund (PIF) da Arábia Saudita, Silver Lake e Affinity Partners, por US$ 55 bilhões, já começa a levantar preocupações no mercado. De acordo com análise publicada no boletim semanal da Alinea Analytics, o endividamento de US$ 20 bilhões contraído junto ao JP Morgan Chase pode abrir caminho para cortes agressivos de custos, incluindo demissões em massa e até mesmo a venda de estúdios inteiros.
O analista Rhys Elliott, da Alinea, classificou a dívida — considerada de risco e avaliada como “single-B” — como uma “bomba-relógio”. Embora a EA tenha fluxo de caixa estimado entre US$ 2 bilhões e US$ 2,5 bilhões anuais, o peso financeiro tende a pressionar a nova gestão a buscar “eficiências”. No jargão do mercado de aquisições alavancadas (LBOs), isso normalmente se traduz em cortes de pessoal, enxugamento de equipes e priorização de produtos de maior retorno imediato.
Segundo Elliott, os estúdios mais vulneráveis são justamente aqueles voltados a jogos single-player e projetos de longo prazo, que não geram receitas contínuas. A BioWare, criadora de Mass Effect e Dragon Age, já havia sofrido cortes significativos neste ano e surge como principal candidata a novas reduções ou até a uma venda. O estúdio Motive, responsável pelo próximo jogo do Homem de Ferro e pelo suporte a Battlefield 6, também foi citado como possível alvo de reestruturação.
“Por que manter uma equipe de RPG de US$ 200 milhões quando as cartas do FIFA geram caixa quase infinito?”, provocou Elliott em sua análise, destacando que os cortes devem preservar, em primeiro momento, os títulos esportivos e de serviço contínuo — embora, na prática, nada esteja totalmente protegido.
Além do aspecto financeiro, a presença do PIF adiciona uma camada política ao negócio. O fundo soberano saudita, presidido pelo príncipe Mohammed bin Salman, tem investido pesadamente na indústria global de games em busca de diversificação econômica, após décadas de dependência do petróleo. Em paralelo, analistas apontam que esses investimentos também têm como objetivo suavizar a imagem internacional do país, frequentemente criticado por violações de direitos humanos. O PIF já mantém participações em empresas como Nintendo, Capcom, Take-Two, Nexon e Embracer Group, além de ter adquirido a Scopely, que recentemente incorporou a divisão de games da Niantic.
Com a conclusão do negócio prevista apenas para o primeiro trimestre do ano fiscal de 2027, que começa em abril de 2026, funcionários e estúdios ainda têm tempo antes que medidas concretas sejam tomadas. Mas a avaliação de analistas é clara: os US$ 20 bilhões de dívida serão um fator determinante, e dificilmente a EA escapará de um ciclo de cortes profundos para ajustar suas operações ao novo cenário.